Temperança, uma virtude rara
A. W. Tozer
Se eu fosse escolher uma palavra para melhor descrever o caráter norte-americano moderno[1], essa palavra seria intemperança[2].
Quase tudo o que fazemos, fazemos com exagero. Estamos criando monstruosidades perpétuas. Se é algo que se move, move-se rápido demais; se é alto, é alto demais; se faz barulho, esse barulho é absurdamente alto; se construímos um carro, é certo que será ridiculamente grande e pomposo, com potência muito maior do que desejamos para nos movimentarmos. Temos telefones demais, postos de gasolina demais, lojas demais. Nossa dívida externa é astronômica, nosso desperdício é inacreditável; nossas autoestradas são numerosas demais, muito complicadas e muito caras. As férias são muito extensas e fatigantes demais. A troca de presentes de Natal tornou-se uma entediante corrida de ratos que nem de longe lembra a vinda de Cristo. Ouvimos música em todo lugar ao ponto de nossos ouvidos sufocarem numa inconveniente confusão melódica.
Num esforço para administrar e direcionar as enormes energias, as prodigiosas atividades e as fabulosas riquezas de nosso povo, surgem mais e mais departamentos públicos e mais e mais funções aparecem, até o ponto em que departamentos e funções saiam totalmente do controle e tornam-se coisas enormes, pesos excessivos que se tornam uma séria ameaça para a saúde do organismo da nação.
Sem dúvida nenhuma, perdemos o controle e pode bem ser que chegamos ao ponto em que não mais é possível voltar. Talvez nunca mais nos recuperemos de nossa imensa farra. Contudo, é preciso dizer que, se nós mesmos estamos nos destruindo por meio dos excessos, isso se deve ao fato de sermos a única nação suficientemente rica para fazê-lo com sucesso e disso extrair um tal colosso de prazer dessa triste tarefa. Outros estouraram os próprios miolos, mas nós podemos nos dar ao luxo de estourar a cabeça toda também, e muitas das nações que nos observam com fingido horror na verdade estão é com inveja de nós. Eles fariam a mesma coisa se tivessem dinheiro para isso. Afinal todos nós somos iguais.
Bem, tudo que acabei de dizer não passa de uma introdução para chegar a uma bem conhecida verdade: quando a humanidade caiu, um dos efeitos da queda foi a perda do controle. Os poderes implantados por Deus dentro do homem saíram de controle e se desviaram das suas funções normais para se tornarem servos da carne e do diabo.
Para mim é óbvio que quase todo pecado não passa de um bem natural pervertido ou conduzido ao excesso. O respeito próprio tornou-se orgulho; o apetite natural se tornou glutonaria; o sono transformou-se em preguiça; o sexo descarrilhou e se tornou sodomia; o amor degenerou em luxúria; o elogio naufragou em bajulação; a determinação se endurece em obstinação; um gosto infantil natural pela brincadeira e pelo jogo cresce com o homem e torna-se um negócio de bilhões de dólares em que dezenas de milhares de pessoas de boa aparência desperdiçam a vida jogando para entreter os milhões de adultos enfadados que mais do que prontamente dão duro para conseguir dinheiro para assisti-los jogando.
Se não fosse verdade que para Deus nenhuma tarefa é mais difícil do que a outra, seria apropriado dizer que, na Sua obra de salvar os homens, Deus assumiu para Si uma tarefa extraordinária. Do nosso pobre ponto de vista, pareceria muito mais fácil criar a raça humana do que recriá-la; pareceria muito menos difícil fazer um homem à imagem de Deus do que refazê-lo a essa imagem depois que tivesse sido marcado pelo pecado. Mas uma vez que Deus tem todo o poder para alcançar os propósitos que toda a Sua sabedoria concebeu, podemos deixar de lado toda e qualquer ansiedade. O zelo do Senhor dos Exércitos levará isso a cabo.
São muitos os problemas que Deus enfrentou na redenção. Como acertar a prestação de contas moral de forma que Deus possa ser justo e o justificador daqueles que creem; como reconciliar o homem a Si mesmo; como recriar um espírito humano e ao mesmo tempo deixar nele todas as suas qualidades essenciais; como habitar numa personalidade sem desalojá-la; como operar no coração do homem crente, voltá-lo para a justiça e ainda deixar livre a vontade humana — esses são alguns dos problemas, para nós insolúveis e impossíveis, mas para Deus não somente possíveis, mas fáceis de resolver.
O assunto do controle entra aqui, pois se a obra da redenção deve ser completa, nossa propensão básica para a perversão e para o excesso precisa ser revertida. Todas as nossas capacidades precisam ser santificadas e dominadas pela direção do Espírito. Do Seu trono no coração do crente, Cristo tem de reinar em todo o reino da alma humana, com todos os seus limites e regiões. A antiga maldição da falta de moderação e do excesso precisa ser destruída.
Por essa razão, a bela palavra temperança ocorre de forma estratégica na teologia do Novo Testamento. A temperança é o timoneiro em tranquilo controle do poderoso navio à medida que sulca o mar com todas as partes trabalhando em harmonia. A temperança é aquilo que no cristão traz todas as faculdades à harmonia umas com as outras, e o caráter inteiro em acordo com o plano de Deus para o homem todo. Numa vida dirigida dessa forma, não há nenhum lugar para excessos.
Precisamos acrescentar duas coisas. Uma é que a temperança não é automática. Ela está na lista do fruto do Espírito, mas requer oração, leitura da Bíblia, carregar a cruz, disciplina firme, obediência e autonegação antes que possa tornar-se uma parte permanente do caráter do cristão.
A segunda é que um homem ou mulher em Cristo que adquiriu verdadeiro autodomínio pode ter certeza que estará em desacordo com o mundo. Os seres humanos dados ao excesso não aceitarão bem a presença da pessoa cheia do Espírito e moderada. Talvez depois da sua morte edifiquem a sua sepultura ou ponham seu nome nalguma escola, mas isso acontecerá um pouco tarde demais para lhe trazer algum conforto. Enquanto viveu, suas circunstâncias foram bem adversas.
[1] Com vergonha, temos de reconhecer que o mesmo se aplica também a nós, brasileiros.
[2] Excesso, falta de moderação.
As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as conheço, e elas me seguem (Jo 10.27).
Ao homem que teme ao SENHOR, Ele o instruirá no caminho que deve escolher (Sl 25.12).
Aplica-te ao estudo da Palavra.
Buscai o SENHOR enquanto se pode achar, invocai-o enquanto está perto (Is 55.6).
Onde está, ó morte, o teu aguilhão? (1Co 15.55)
Orar bem é estudar bem.
Seca-se a erva, e cai a sua flor, mas a palavra de nosso Deus permanece eternamente (Is 40.8).
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Em tudo dai graças (1Ts 5.18).
Ao homem que teme ao SENHOR, ele o instruirá no caminho que deve escolher (Sl 25.12).
Elevo os olhos para os montes: de onde me virá o socorro? O meu socorro vem do SENHOR, que fez os céus e a terra (Sl 121.1-2)
A vereda dos justos é como a luz da aurora, que brilha mais e mais até ser dia perfeito (Pv 4.18)
Deus tudo vê
Não temais, pequenino rebanho.